sábado, 17 de julho de 2010

HISTÓRIAS DA MINHA VIDA: HOMENAGEM A NATANAI FREIRE DO OURO, BAIO

Em meados dos anos 80 eu morava em Jacobina, mas me estabelecia comercialmente em Lages do Batata onde administrava o arrendamento de uma sorveteria e lanchonete, a Sorveteria São Geraldo.
Além de vender ao comércio local, fornecíamos também picolés e sorvetes em larga escala para diversos lugares da região onde mantínhamos congeladores nos principais pontos de comércio e, a cada 15 dias, fazíamos o reabastecimento recebendo o pagamento correspondente à quantidade de produtos vendidos pelo comerciante.
Em Ourolândia, pelos laços de amizade desde a época do meu avô, e principalmente pela conduta ilibada, nossos produtos eram comercializados em três grandes congeladores, por Natanai Freire do Ouro, o agora saudoso Baio, meu padrinho, amigo meu e da minha família, no Mercadinho Freire, à Praça José Prado Alves.
Baio era o campeão de vendas do nosso produto, chegando a escoar em torno de seis mil picolés e trezentos sorvetes durante o período dos 15 dias. É bom lembrar que naquela época sorvete e picolé em Ourolândia era ainda um produto muito desejado. Talvez o fato da Feira Livre ser realizada na Praça onde ficava o estabelecimento ajudasse também nas vendas.
Numa tarde de verão, recebi um recado do “Meu Pardinho Baio” (era assim que eu carinhosamente o tratava) avisando que no seu estabelecimento faltara os produtos já há mais de oito dias.
Para as entregas usávamos um Pick Up Fiat Fiorino, e saía eu às pressas para atender a solicitação do cliente quando, ainda em Lages, a danada quebrou a junta homocinética (quem teve uma sabe o quanto isso dava defeitos) ficando o carro inerte, sem tração.
Sem saber o que fazer já me desesperava (picolé é produto que não pode ficar muito tempo fora de refrigeração) e também não poderia perder a oportunidade de faturar mais que o programado para aquela quinzena.
Como mágica a solução caiu do céu! Percebi um ônibus da extinta Empresa de Transportes Jacobinense, parado ao lado da pista com destino à cidade de Umburanas, via Ourolândia. Fui até o motorista e lá, para minha surpresa, tratava-se de um velho amigo (João de Josué, um filho de Ourolândia). Expliquei a situação e ele imediatamente se prontificou a levar as enormes caixas de isopor até o destino e fazer a entrega no Mercadinho Freire. Tentei pagar o frete e ele gentilmente se negou a receber qualquer valor, me afirmando que fazia questão de me prestar aquele favor, afinal se tratava de um amigo.
E foram os picolés e sorvetes no bagageiro do ônibus...
Cerca de 20 e poucos dias depois me dirijo até Ourolândia e ao chegar ao Mercadinho Freire percebi meu padrinho com um comportamento diferente do comum, me tratando com certa frieza. Estranhei, mas resolvi atribuir o gesto a algum problema que não fosse eu e me dirigi aos congeladores, percebi que todos estavam vazios! Ótimo, pensei: “e não é que já vendeu tudo novamente?” Fiquei mais alegre que pinto no lixo, peguei um tamborete e fui juntar-me ao meu padrinho e mais uns dois amigos que conversavam sentados em frente ao estabelecimento.
Nisso meu padrinho resolveu tocar no assunto: - Tô meio chateado com você. Já tem quase 30 dias que você não aparece e os clientes estão deixando de comprar seu produto. Mandei recado e você sequer me deu satisfação...
-Interrompi e perguntei:
- O senhor não recebeu? Eu mandei pelo ônibus da Empresa Jacobinense há mais de 20 dias !
- Então tome providências porque a mercadoria não chegou aqui.
Pedi desculpas pelo ocorrido e saí direto para Jacobina onde ficava a garagem da citada empresa (exatamente onde hoje é a garagem da Hila Transportes, no Bairro da Caeira próximo ao Centro de Convivência do Idoso).
Lá chegando fui até onde ficavam estacionados os ônibus e procurei por João de Josué. Alguém me informou que ele havia viajado e que só retornaria na outra semana. Procurei qual o carro que ele trabalhava e se o mesmo estava no pátio. O rapaz apontou com o dedo para o ônibus n.200. Perguntei se poderia verificar no bagageiro se havia algo esquecido por mim há cerca de 20 dias. Recebi a permissão e para minha surpresa, ao abrir os porta malas deparei-me com as enormes caixas de isopor, nelas, milhares de palitos e papeis nadando num mar de um suco colorido com cheiro de sorvetes e picolés!!!
Depois disso, nunca mais encontrei com João de Josué! Mas ao menos voltei a negociar com meu padrinho, tendo de volta a seriedade e o sorriso dele.
José Carlos Benigno.

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